Big girls don’t cry

Muitas vezes eu já desejei ter um coração de pedra ao invés desse todo remendado que carrego no peito. O infeliz, além de acelerar os batimentos cardíacos involuntariamente, quase pára a cada nova decepção. Eu converso, explico, mando ele não se envolver, peço para não criar expectativas, digo com todas as letras que não deve confiar nas pessoas e que nem todas são dignas de sua pureza, mas ele, além de velho, remendado e teimoso, é surdo.

Como não adianta conversar com quem não quer ouvir, eu apelo para o cérebro. Eu sei que ele me entende e tenho a impressão de que ele concorda comigo, embora prefira ficar em silêncio. Como eu, ele acha mesmo mais prudente pensar antes de agir, ter cautela, não acreditar em palavras apenas, não se entregar de primeira, não sonhar por terceiros.

Sou coração e cérebro. Mais um do que outro. Ora um, ora outro. Um eterno desequilíbrio. Há dias eles não param de discutir. O cérebro diz que estou chorando porque o coração é teimoso e não deveria se entregar a alguém que mal conhece, o coração diz que estou chorando porque o cérebro não confia em ninguém e preferiu não demonstrar seus reais sentimentos. Minha cabeça dói mais do que ressaca de vinho vagabundo e eles estão longe de chegarem em um acordo.

Com coração e cérebro mais preocupados em culpar um ao outro, adoto táticas que incluem deletar o celular do infeliz mesmo que eu já saiba de cor, recitar mil vezes o mantra “eu te odeio”, “eu te odeio”, eu te odeio”, não freqüentar seus lugares preferidos nem ouvir as “nossas” músicas, para tornar o fim menos doloroso.

De um modo geral, funciona. Se não tem que ser, não vou implorar. Ligar depende de mim. Passar em frente a casa dele depende de mim. Ir no restaurante que fomos um dia depende de mim. Mandar torpedo depende de mim. Escrever e-mail depende de mim. E, oh céus, se ele resolver ligar, depende de mim, só de mim, atender. E já decidi que hoje não.

É para esquecer? Eu dou um jeito. Mas eu não posso mandar em tudo e não sei o que faço para mudar o gosto musical da humanidade! No carro, no restaurante, no barzinho, na boate, em todo lugar, aonde quer que eu vá, todas as pessoas resolveram escutar a nossa música. O coração não agüenta, nem o cérebro. Eles dão as mãos, desolados. Se solidarizam e entendem o meu esforço. Não é fácil ouvir a música e ter que dançar sozinha.

Idiotilde

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Giseli Rodrigues

Mãe do Lucas. Escritora. Professora. Revisora. Especialista em Letras, Recursos Humanos e Gestão Empresarial. Estudante de Psicologia. Chocólatra. Flamenguista. Pintora nas horas vagas. Bem-humorada. Feliz.

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