Por mais que a gente compartilhe a vida com alguém, há sempre uma parte de nós que preservamos. Sentimentos que não contamos a ninguém – e alguns que nem entendemos. Muito de nós só nós sabemos. Conhecemos. Sentimentos. Mais ninguém. E constatamos que caminhamos sozinhos, mesmo quando acompanhados. Cada um tem uma maneira de ver e sentir a vida. Inclusive as mesmas vivências representam experiências diferentes para cada pessoa.
Por que estou falando tudo isso? Porque há um mundo em cada um de nós que não compartilhamos com ninguém. Nem com a nossa cara-metade, carne minha, alma gêmea. E não há nada de errado nisso. Não há má fé. Não há falta de amor. Errado é mentir, inventar histórias, omitir fatos relevantes para a vida do casal, dizer uma coisa e fazer outra, prometer algo e não cumprir. Não contar tudo para o amor da nossa vida não significa esconder as coisas. Significa que cada pessoa é um mundo inteiro a ser descoberto. Por ela mesma.
Mas o que você diz ao companheiro? O quanto da sua vida você compartilha? Você tem liberdade para dizer o que pensa? Pode falar sem reservas sobre o que te incomoda sobre a relação, os amigos do casal, os familiares? Seus sentimentos são importantes para o outro? Tenho visto que muita gente não pode falar abertamente com a pessoa com quem casou. Sobre coisas simples, como por exemplo, que não gostaria de ir numa festa de família, que não quer receber determinada pessoa naquele dia, que não se sente à vontade com determinado amigo do outro, que está com ciúmes de alguém.
Algumas pessoas estão em uma casa onde não opinam em nada sobre a decoração. Fazem viagens sem incluir um lugar que adoraria conhecer. Fazem programas com companhias indesejáveis para não desagradar o outro. E não têm coragem de dizer o que desagrada. Ou acham que relacionamento é assim mesmo: aturar um ao outro.
Uma coisa é ignorar uma pia molhada, um chinelo fora do lugar ou uma louça na pia. Ao longo do tempo a gente aprende que nem tudo é do nosso jeito. E tudo bem. Outra coisa bem diferente é poder dizer que determinada opinião te ofendeu, que marcar compromissos sem te consultar atrapalham sua rotina, que não gosta de determinada pessoa. Um relacionamento precisa ser bom para os dois.
Diferente do que muitos acreditam, quando tomamos a decisão de casar, viver junto, dividir a vida com alguém, não conhecemos o outro em sua totalidade. Até porque estamos mudando o tempo todo. Cada um tem suas ideias, seus gostos, seus hábitos e sentimentos. E precisa encontrar uma maneira de expor o que for importante para o seu bem-estar e do relacionamento. Sem medo. Não é gritar, impor, só fazer as coisas do seu jeito. É fazer as coisas do seu jeito e também do jeito do outro. Ter liberdade para dizer o que sente e chegar num consenso.
Todo mundo precisa de um ambiente amoroso, seguro e confiável para ser você mesmo. E é importante que o seu próprio lar – e o seu relacionamento – seja esse lugar de reencontro. Com você mesmo e com o outro.
Crônica publicada no Amor Crônico em 19 de março de 2018.