E eu te achava tão chato…

Ou: a língua é o chicote do raboNunca havia trocado uma palavra com Pac Man e, simplesmente, não gostava dele nem um pouco. Sabe essa gentinha que tem o rei na barriga? Que anda como se o resto do mundo não existisse? Que tropeça porque nem olha para o chão? Pac Man era assim: o máximo. Na cabeça dele, claro.

Percebi que ele também não ia com a minha cara quando amigos em comum nos apresentaram em uma festa. Depois do cumprimento solene, e obrigatório, voltamos cada um para a rodinha que julgamos mais simpática. Ou seja, bem longe um do outro.

Todas as vezes em que nos encontramos nas ruas da cidade depois daquela apresentação agimos como se a apresentação não tivesse sido feita. Nem oi, nem sorriso amarelo, nem um tchauzinho tímido. Meros desconhecidos em meio a multidão. Pessoas como tantas outras, simplesmente.

Nestas tantas voltas que o mundo dá, Deus não se esqueceu de mim e pôs Pac Man em meu caminho. No meu orkut, para ser mais exata! Num ato de insanidade mental pedi sua amizade e ele aceitou. Não só aceitou como me adicionou no msn e passamos a conversar todos os dias.

Foi assim que conheci um Pac Man que nunca imaginei que pudesse existir. Tinha uma conversa legal, me divertia com tantas implicâncias, gostava de algumas músicas que eu gostava e ainda me dava alguns conselhos amorosos. Ele nem era assim tão chato, tão metido, tão esnobe, tão nariz em pé.

Quando, por um motivo qualquer, ele não estava no messenger ou não mandava um torpedo, eu sentia sua falta. A antipatia foi dando lugar a alguma coisa que não sei o nome, mas sei que não era amizade, porque ainda era muito cedo para me tornar amiga de infância de uma pessoa que até bem pouco tempo era desprezível.

Um belo dia ele resolve me convidar para sair e, num segundo ato de insanidade mental, eu digo sim. Confidenciou que me achava uma chata, metida, esnobe, nariz em pé, rei na barriga e isso me fez refletir. Somos seres complexos demais para poucos adjetivos vazios. Não cabemos em nós mesmos, como caberíamos em palavras criadas ao acaso?

Parece clichê, e é mesmo, mas diante desse do tombo que levei pelo mega-hiper-ultra-super desprezível metido a besta, só tenho um conselho a dar – conselho de burralda não serve para coisa alguma, mas comecei, vou terminar: não julguem pelas aparências. Às vezes parece, mas não é, entendem?

Eu disse algumas vezes para algumas amigas que jamais, em tempo algum, nunca, never, ficaria com o Pac Man. Preciso dizer tudo o que ouvi depois? Por isso que deixo outro conselho, bastante simples, mas igualmente importante: nunca diga nunca.

Idiotilde

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Giseli Rodrigues

Mãe do Lucas. Escritora. Professora. Revisora. Especialista em Letras, Recursos Humanos e Gestão Empresarial. Estudante de Psicologia. Chocólatra. Flamenguista. Pintora nas horas vagas. Bem-humorada. Feliz.

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