Dia dos (des)namorados

A burralda romântica aqui já tinha comprado o presente para Parafina, algo que ele estava de olho há tempos, um cartão maneiríssimo, uma lingerie chiquérrima e estava ansiosa pelo tão esperado Dia dos Namorados. O que importa se é data comercial? Se é um dia como outro qualquer? Se tem engarrafamento nas ruas, uma aglomeração nos restaurantes e fila no motel?

O amor é lindo. Dia 12 de junho não pode passar despercebido e meu namoro com o homem mais bonito, sincero, inteligente e gostoso do mundo já durava mais de um ano, nos amávamos incondicionalmente e eu estava louca para dar e receber presentes! Ver aquele sorriso lindo, beijar aquele beijo e olhar aqueles lindos olhos claros me olhando.

E daí que nos beijávamos diariamente e que os olhos dele não ficavam mais lindos dia 12? Cartazes espalhados pela ruas, panfletos, propagandas, encartes, tudo faz lembrar que estar apaixonada é a melhor coisa do mundo, que a data é especial, que namorar é o máximo. Então pronto, eu estava namorando!

Uns dias antes da nossa data tão especial, Parafina disse que estava passando mal, foi embora e, horas depois, ao ligar para ele, surpresa: não estava em casa! Claro que também não atendeu o celular, não ligou para dar satisfação e brigamos, por telefone, no dia seguinte. Chorei, esperneei, perguntei o que estava acontecendo, exigi uma justificativa.

Talvez fosse melhor não ter perguntado. Ao decidir resolver nossa pendenga pessoalmente descobri que, como eu, ele era precavido e já tinha resolvido qual seria o meu presente: um belo par de chifres. Ah, me perdoa, eu te amo, você é linda, mas, sabe como é, eu conheci uma mulher e saímos juntos.

Quase desidratei de tanto chorar e até hoje não sei como ainda tenho lágrimas, porque chorei muito mais do que podem imaginar. Não conseguia dormir, sentia dores em todo corpo e mal acreditava que tudo aquilo tinha acontecido, justo comigo. Eu o amava. Nunca o traí. Como pode uma coisa dessas?

Mesmo sentindo dores em todo o corpo, com a auto-estima abalada e alma aos prantos, fui trabalhar no dia seguinte, no outro, no outro e também no Dia dos Namorados, quando a empresa fez um evento belíssimo, com direito a orquestra com violinos e tudo, para brindar o amor. Eu teria achado a idéia brilhante se não estivesse tão decepcionada!

Poucos sabiam da minha desilusão amorosa, mas quando resolveram tocar Eu sei que vou te amar desabei em lágrimas. Lenço, copo d’água, o que aconteceu, calma, vai ficar tudo bem, diga alguma coisa. A empresa inteira, todos os colegas, assustados, tentando entender o que se passava. E, claro, tive que explicar que o namoro acabou para não passar como maluca. (Acho que fui tachada de mais maluca ainda!).

O evento acabou, o expediente encerrou e fui ao shopping enfrentar filas, empurra-empurra e lojas lotadas. Voltei para casa cheia de sacolas:

– Id, que compras são essas?
– Meu presente de Dia dos Namorados!
– Mas você não tinha terminado o namoro?
– Mãe, EU me dei de presente.
– E o presente do Parafina, o que você vai fazer?

Só minha mãe para lembrar de uma coisa dessas. O presente, aquela caixa linda, o cartão fofo, minha lingerie que eu não tinha mais para quem mostrar. O que eu faria com aquilo? Senti vontade de chorar novamente, mas o estoque de lágrimas já estava esgotado.

Durante muito tempo guardei aquela caixa num canto esquecido do armário. Hoje ela não existe mais, me desfiz daquelas lembranças no dia em que me certifiquei de que elas não significavam mais nada para mim, quando encontrei Parafina por acaso e não estremeci da cabeça aos pés.

Aquele foi o pior Dia dos Namorados da minha vida. Mas aprendi que é sempre bom deixar para comprar o presente na última hora mesmo, porque ninguém merece ficar sofrendo pelo canalha e ainda ter prejuízo!

Idiotilde

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Giseli Rodrigues

Mãe do Lucas. Escritora. Professora. Revisora. Especialista em Letras, Recursos Humanos e Gestão Empresarial. Estudante de Psicologia. Chocólatra. Flamenguista. Pintora nas horas vagas. Bem-humorada. Feliz.

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