Sobre as pequenas mentiras

Dois homens sentaram ao meu lado no transporte público. Eram amigos e levaram sanduíches e refrigerantes para fazer um lanche durante a viagem. Até aí nada demais. Foram conversando sobre família, trabalho, coisas cotidianas, até que um deles disse “quando eu chegar em casa vou falar com aminha mulher que estou sem fome, que não comi nada e estou de dieta”. O colega, sem entender o porquê omitir que comeu um salgado, questionou: “por que você vai mentir? Não é mais fácil falar que comeu no caminho?”.

O amigo tentou a todo custo convencê-lo de que não existia razão para mentir. Mas todos os seus argumentos eram refutados com desculpas mais estapafúrdias do que omitir que comeu um salgado. E eu fiquei pensando que, assim como ele, existem pessoas que gostam de mentir, vivem de mentiras, omitem acontecimentos, inventam histórias. Que mentir nos relacionamentos é algo comum, recorrente e visto como normal.

Quem de nós não conhece uma amiga que faz uma compra e diz para o marido que estava na promoção? Ou que não tem dinheiro, mas pede do marido para economizar o seu? Um colega de trabalho que depois da festa da empresa foi para outro lugar, mas falou para mulher que o evento acabou mais tarde? Um amigo que diz que vai pescar, mas foi para outro lugar e só comprou o peixe no mercado para disfarçar?

Por que as pessoas optam por mentir quando dizer a verdade é tão mais simples? Como conseguem se lembrar das histórias que cria? Será que não se confundem com tantas invenções? Eu não tenho resposta para isso. Só sei que mentir, seja por qualquer motivo, é desnecessário e quem mente por pequenas coisas aos poucos passa a mentir por circunstâncias maiores.

Mesmo as mentiras que parecem inofensivas podem estragar um relacionamento. Conhecer alguém e omitir, comprar um presente para um amigo ou familiar e nem mencionar, ir em um encontro inocente e esconder, comprar uma roupa e dizer que ganhou, inventar uma promoção para comprar alguma coisa, almoçar com um grupo de colegas e omitir que alguém estava presente e não mencionar por medo da reação do outro são exemplos de mentiras, que se forem descobertas, podem trazer mal estar, desentendimento e insegurança.

Descobrir que o outro mentiu leva a desconfiança, insegurança e a crença de que há mais coisas escondidas do que as que foram descobertas. Se você precisa esconder o que faz sua relação não está bem. Se você esconde tudo que faz sem que haja motivo para isso talvez você não esteja bem.

Muitas pessoas acreditam que mentir os torna livres e deixa a vida mais interessante. Mas na verdade são prisioneiros de suas ações, têm medo de serem descobertos e correm o risco de estragar seus relacionamentos por bobagens. Liberdade é ter segurança para falar o que fez e o que sente sem medo.

Crônica publicada no Amor Crônico em 5 de fevereiro de 2018.

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Giseli Rodrigues

Mãe do Lucas. Escritora. Professora. Revisora. Especialista em Letras, Recursos Humanos e Gestão Empresarial. Estudante de Psicologia. Chocólatra. Flamenguista. Pintora nas horas vagas. Bem-humorada. Feliz.

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