Casamento e fazeres domésticos

Recentemente assisti um vídeo do Içami Tiba sobre família. Falava que as mulheres precisam se livrar da culpa de trabalhar fora de casa e não cuidar dos filhos em tempo integral e que os homens precisam se responsabilizar tanto quanto as mulheres pelos afazeres domésticos e educação das crianças, principalmente quando suas esposas também se dedicam às carreiras tanto quanto eles.

Parece simples. Básico. Óbvio. Mas, infelizmente, compartilhar os fazeres domésticos e responsabilidade pela educação dos filhos ainda não é uma realidade em todas as famílias. Com certeza em pouquíssimos lares é o pai que escreve o bilhete escolar, arruma a mochila do filho para o dia seguinte, dá mamadeira, troca fraldas e não espera a mulher chegar do trabalho para esquentar o jantar.

Conheço muitas mulheres que trabalham tanto quanto seus maridos e, ainda assim, são as responsáveis pela organização da casa. Quando têm empregada ou diarista são elas que sabem quais materiais de limpeza comprar, fazem lista do mês, dão as orientações para a limpeza e organização da casa, planejam a ida e volta dos filhos da escola, se preocupam com o lanche das crianças e muito mais.

Quando o homem se responsabiliza com alguma tarefa as pessoas olham com espanto e um tanto de inveja e afirmam “que bom que ele te ajuda!’. Com toda revolução sexual, independência feminina e brados de empoderamento, ainda cabem aos homens só ajudar. Muitos são coadjuvantes em relação à vida doméstica e podem se dar ao luxo de dizer que tiveram um dia exaustivo no trabalho, sentar no sofá e não fazer nada mais.

Uma pesquisa do IBGE, realizada em 2016, indica que nove em cada dez mulheres realizam algum tipo de tarefa doméstica por, no mínimo, uma hora semanal. Já entre os homens, sete em cada dez realizam tarefas em casa, mas dedicam metade do tempo em relação às mulheres.

Não por acaso muitas mulheres estão estafadas, sobrecarregadas, cansadas e culpadas. Educadas para estudar, ter uma carreira, ser independente e contribuir de maneira igualitária com as responsabilidades financeiras, não se livraram da carga de cuidar dos afazeres domésticos, invisíveis aos olhos dos outros. No vídeo que assisti Içami Tiba toca num ponto importante: os homens hoje se beneficiam da emancipação das mulheres, sexual e financeira, mas não dividem as responsabilidades domésticas e familiares.

Se você é mulher e está sobrecarregada com milhares de responsabilidades, converse com o seu parceiro. Proponha nova divisão de tarefas, peça ajuda. Muitas de nós estão tão acostumadas a assumir as responsabilidades do lar, ser a dona de casa, assistir, na vida e na arte que é nossa obrigação cuidar de tudo e de todos que, inconscientemente, reproduzimos este padrão. Por mais esclarecidas, estudadas e abertas que somos.

Se você é homem e leu até aqui, não espere a sua namorada ou esposa pedir ajuda e dizer o que fazer. Não espere ela chegar para esquentar seu jantar, arrumar a mesa e arrumar seu prato. Não espere ela decidir o que fazer para comer. Não espere que ela abra a mochila dos filhos de vocês e coloque a roupa molhada para secar. Não espere que sempre ela falte o trabalho para levar as crianças no médico ou vá numa reunião escolar. Não espere. Seja lá como for a rotina de vocês, não espere. Contribua.

É lógico que cada família tem o seu jeito, seus valores e a sua rotina. Não há nada de errado em uma mulher que abdica da vida profissional para cuidar da casa e dos filhos. Como também não há mal nenhum em um homem que faz o mesmo, embora essa realidade seja bem menos comum. Geralmente é a mulher que abre mão de seus sonhos para manter os outros membros da família sonhando. Por que, pergunto eu, em uma relação alguém tem que deixar de sonhar? Por que nos ensinaram que quando um ganha o outro tem que perder? Por que alguém tem que sofrer para o outro ser feliz?

Viver a dois se torna mais leve, fácil e prazeroso quando ambos se responsabilizam pela casa que vivem, a dinâmica da rotina, a educação dos filhos, a divisão de tarefas. Dificilmente alguém gosta de lavar louça, colocar roupa na máquina, fazer comida todo dia, recolher o lixo, ir ao supermercado, brigar para o filho tomar banho/escovar os dentes, trocar fralda de criança, fazer bilhete para professora. Faz por necessidade, por cuidado, por obrigação. E por amor. Amor exige cuidados e responsabilidades.

Não adianta sobrecarregar o outro e depois esperar noites maravilhosas de sexo, declarações de amor, demonstrações de carinho. Quem anda estafado, cansado, sobrecarregado e preocupado em manter a vida de todos funcionando perfeitamente não tem tempo para pensar no seu próprio prazer nem no lazer. E o pouco tempo que tem prefere descansar.

Por outro lado, se você conhece algum homem que participa da vida doméstica e compartilha a responsabilidade da casa, por favor, pare de olhar para a mulher dele e dizer “como você tem sorte!”, “que bom que fulano de ajuda!”. O casal que divide a vida e mora sob o mesmo teto precisa ser o dono da casa. Igualmente. O que não deve causar espanto algum.

Crônica publicada no Amor Crônico em 18 de junho de 2018.

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Giseli Rodrigues

Mãe do Lucas. Escritora. Professora. Revisora. Especialista em Letras, Recursos Humanos e Gestão Empresarial. Estudante de Psicologia. Chocólatra. Flamenguista. Pintora nas horas vagas. Bem-humorada. Feliz.

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