Tem dias em que me pego pensando em você desde a hora em que acordo até a hora de dormir. Vivemos tanta coisa em tão pouco tempo! Teríamos vivido muito mais se a morte não existisse.
Quantos bombons já teríamos consumido? Quantas caminhadas na praia já teríamos feito? Quantas vezes teríamos bebido juntos aquele vinho tinto? Quantas declarações teríamos feito um para o outro? Quantos sanduíches naturais você já teria preparado para mim?
Hoje entendo sua pressa. O desespero para encontrar “a mulher certa”, ter filhos e morar no Leblon. Como era engraçado ver você planejar sua vida! Ri tantas vezes de suas grandes paixões que não duravam mais de um mês, ri também dos nomes que escolheu para os seus filhos e da sua cara de felicidade por ter escolhido o apartamento em que os veria crescer. Hoje entendo sua pressa: eu, como todos os nossos amigos, tinha todo o tempo do mundo – você não.
Procuro pelos cartões que você me escreveu, lembra deles? Não os encontro, embora os procure por toda a parte. Ouço Cássia Eller, Caetano – e choro. Abro o Euclídes da Cunha, presente seu, que nunca li. Ouço ainda a sua voz. Vejo seu rosto. E sua tatuagem. Nem deu tempo de aprender capoeira! Nem de irmos juntos a Portugal, Minas Gerais e Salvador.
Nos dias em que sinto saudades, tenho vontade de acreditar que existe outra vida além desta, que você está por perto e que iremos nos encontrar algum dia. Por que meu ceticismo não permite?
(*) Texto do dia 24 de julho de 2004, publicado no blog À Flor da Pele, onde escrevia.