O fim do começo

Lógico que fiquei eufórica quando aquele homem jovem, alto, branquelo e de olhos azuis entrou na minha sala, principalmente porque na minha imaginação ele era velho, gordo e careca – até então só tínhamos nos falado por telefone e e-mail para realizarmos um evento na empresa em que eu trabalhava. Como não sou de ficar dando mole para ninguém em ambiente de trabalho, nem demonstrei surpresa e agi como se ele fosse o mais feio e desinteressante dos mortais.

Alguns meses se passaram, nunca mais nos vimos, eu já não estava na empresa em que nos conhecemos e me deparei com um e-mail dele. Assim, do nada. Pegou meu e-mail com uma amiga que também me conhecia, escreveu meia dúzia de futilidades e enviou. Educada, respondi. Começava assim, o princípio do fim.

Fui logo procurar o nome dele no orkut. Lá estava para quem quisesse ler, NAMORANDO. Juro que me senti até mal por ter pensado que ele poderia ter se interessado por mim. Mente maldosa a minha! Ele só quis ser educado. Nem todo homem está afim de mim, não é mesmo? Onde estava com a cabeça de imaginar que aqueles olhos azuis tinham segundas intenções?

Quando aceitei seu convite para almoçar me dei conta do quanto havia sido ingênua. Durante a refeição não teve clima de romance, conversamos de signos a deuses gregos, passando por política e me comportei como se fôssemos apenas bons amigos. Ele também. Até um momento. Na hora de irmos embora veio com aquele papinho previsível (mas que eu não tinha previsto!) de que ele se interessou por mim desde o dia em que nos vimos, que eu sou linda, inteligente e tudo mais.

Eu fiquei meio atordoada, mas meu ego ficou inflamado, claro. E acabei retribuindo um beijo. Durante a semana ele deu um jeito de me entregar um cd, mandou mensagens bonitinhas, ligou. Quase dava para esquecer o namorando de tanta atenção que me dedicava – e olha que foi só um beijo! Numa dessas tantas ligações ele disse que tinha que conversar comigo algo super importante, que só poderia ser dito “olhando nos seus lindos olhos verdes”.

Ansiosa, impaciente, nervosa, quase morrendo de tanta curiosidade, eu esperei longos dias até que nos encontrássemos para a tal conversa. Tanto suspense para que? Para ele dizer que tinha namorada. Tanto suspense para falar o que eu já sabia! Ainda emendou com a clássica “tenho medo que a gente se envolva”. Como eu só ouvia, ele se viu num monólogo e tentou uma interação: “o que você acha?”, “não vai dizer nada?”, “quero saber sua opinião”.

Em outras palavras ele estava dizendo “Id, eu tenho namorada, gosto dela, estamos bem, não pretendo me separar, mas eu estou afim de ficar com você. Aceita ficar comigo sem compromisso?”. Eu virei as costas e fui embora. Ele não conseguiu traduzir meu silêncio como uma negativa e ainda liga, manda mensagem, grava cd e vem entregar, convida para ir a praia, fazer caminhada, ir a shows, teatro, restaurantes e, pasmem, até uma viagem sugeriu!

Eu não consigo mergulhar em uma história em que não se pode sonhar com um final feliz, em que não se pode desejar mais do que uns encontros espaçados, em que não se tem nada a perder – nem a ganhar.

Idiotilde

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Giseli Rodrigues

Mãe do Lucas. Escritora. Professora. Revisora. Especialista em Letras, Recursos Humanos e Gestão Empresarial. Estudante de Psicologia. Chocólatra. Flamenguista. Pintora nas horas vagas. Bem-humorada. Feliz.

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